sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

O culpado é o ciclista!

Mais um ciclista foi atropelado por um ônibus no Recife, na manhã desta quarta-feira. Desta vez, o fato ocorreu na recém inaugurada faixa azul da Avenida Mascarenhas de Moraes, exclusiva para ônibus. Como de costume, declaram a vítima como único culpado.



Sem a devida investigação do ocorrido não é possível saber por completo a história! Não dá pra saber se o ciclista realmente entrou de repente na faixa de ônibus. No entanto é fato que, em linhas gerais, ninguém quer se machucar, ninguém é terrorista suicida no trânsito e ninguém quer morrer; da mesma forma que ninguém quer machucar ou matar outra pessoa no trânsito. Não! Não dá pra saber, espero que tenham câmeras de segurança no local para apurar melhor a responsabilidade de cada um. Mas André Pasqualini foi atrás da história e ouviu do próprio atropelado:

Aquela faixa é muito estreita e eu estava no cantinho como sempre, daí o ônibus tentou me ultrapassar, passou muito perto até que a lateral dele bateu no meu guidão e eu caí, então a roda do ônibus passou por cima da minha perna


Tanto o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) quanto a Política Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU) dizem claramente de quem é a prioridade. Lá está escrito que o MAIOR deve sempre PROTEGER o MENOR, e que os órgãos de trânsito DEVEM PROVER, PROJETAR e PENSAR infraestrutura para os CICLISTAS e COM PREFERÊNCIAS SOBRE OS MOTORIZDOS! A Companhia de Trânsito e Transporte Urbano (CTTU) projetou no local uma nova infraestrutura e não deu nenhuma preferência ao ciclista. Na verdade, em reuniões entre representantes da Ameciclo e a CTTU, foi constatado que eles realmente colocam o transporte coletivo MOTORIZADO à frente dos NÃO MOTORIZADOS, contrariando a Lei FEDERAL (PNMU). Então, é mais do que esperado que quando você projeta algo para o motorizado sem antes resolver a questão do ciclista, você acaba por gerar potenciais atropelamentos e colisões. Está aí o resultado! A CTTU fez a faixa azul e não indicou (não tem indicado em canto algum) onde o ciclista deve transitar. Disse em nota no jornal que não deveria ir para a faixa azul, pois seria perigoso.


Ótimo, CTTU! E VAI POR ONDE??? Informe ao ciclista como! E não é com campanha não, é sinalizando mesmo. Um ciclista relatou que transitou pela Mascarenhas e não sabia por onde ir. Na esquerda os carros voavam, ao lado da faixa de ônibus eles buzinavam como loucos... Agressões e agressões! Se na calçada e no canteiro é proibido, não há ciclovia e o bordo direito foi retirado. Onde transitar? A faixa de ônibus é o que sobra. É melhor ter um, dois, três ônibus cruzando com você no percurso inteiro do que mil carros te ameaçando.


A bicicleta utilizar a faixa exclusiva de ônibus não é proibido pelo CTB! O artigo 184 coloca a infração que pode ser resumida como “Transitar com veículo na faixa da direita se ela estiver regulamentada para outro tipo de veículo”, mas, claramente é um dos erros que o próprio legislador do CTB comete quando esquece que determinou que bicicleta era um veículo. Esse artigo de infração não deve se sobrepor aos artigos que regem as permissas do código como um todo. Vamos lá:
O artigo 58 OBRIGA o ciclista a ANDAR nos BORDOS na inexistência de infraestrutura para ele destinada e COM PREFERÊNCIA SOBRE OS MOTORIZADOS. Se ele for transitar na via, deverá fazer nas MARGENS da pista. E aí, quando se lê o artigo 57 para percebe-se isso, pois este obriga os ciclomotores a andarem na direita e o parágrafo único diz que na existência de uma faixa exclusiva na direita, eles devem ir para a adjacente a esta. Fica bem claro que a existência da faixa azul não cria um bordo novo e portanto o ciclista vai ter que andar nessa faixa, e que a limitação imposta no artigo 57 não foi propositadamente repetida no 58. O legislador percebeu o risco que é andar no meio da via ou numa faixa de alta velocidade ou ainda achoU que o código seria seguido pelas autoridades de trânsito e que a estrutura para o ciclista iria ser criada previamente. Claramente, o artigo 184 que proibiria  o ciclista de andar na faixa de ônibus não foi escrito pensando nisto. O que chegamos em...


Em outros países, o compartilhamento é possível. No Recife, o ciclista tem que usar as paralelas.

NÃO HÁ PLACAS SINALIZADORAS QUE INDIQUEM QUE É PROIBIDO AOS CICLISTAS TRANSITAR NA VIA. Então não é para usar as vias paralelas obrigatoriamente, como dito por pessoas dos órgãos de trânsito e gestores da cidade! O ciclista é livre para escolher onde deve transitar, a não ser que haja uma proibição expressa e bem sinalizada.


Portanto chegamos no impasse:
De quem é a CULPA? A culpa é do ESTADO (enquanto ente, seja em que esfera for) que não projetou as vias PRIMEIRO - conforme LEI FEDERAL - para os NÃO MOTORIZADOS, que não indicou e sinalizou devidamente ao ciclista onde ele deveria transitar, que não educou para o trânsito, desde o início e de maneira correta, os motoristas, muito menos o ciclista, ou qualquer cidadão desde a escola. A responsabilidade é do estado que é carrocrata!
De quem é a CULPA? A culpa é NOSSA enquanto sociedade! Nossa de permitirmos esse tipo de coisa acontecer repetitivamente, de não pressionarmos o estado a tomar as corretas providências, de elegermos quem elegemos e de pouco fiscalizar os eleitos.
De quem é a CULPA? Das empresas de ônibus que colocam seus motoristas para trabalharem como condenados, estressados, e cobram deles excessivas velocidades em suas voltas.
De quem é a CULPA? Do motorista de ônibus, que não tomou conta do menor, que não conseguiu evitar uma colisão, que não reduziu ao ver perigo, que não respeitou o 1,5m de distância ao passar pelo ciclista, que utiliza uma máquina pesada e cede à pressão do patrão.
De quem é a CULPA? Não! Não é do ciclista, excluído e marginalizado, sem educação e sem infraestrutura, sem conhecer o código, sem poder transitar decentemente, sem nada: UM MARGINAL. À margem da sociedade que o exclui.


Mas, é o que todos decretam: O culpado é o ciclista! Ele é culpado por estar nas ruas! Tem culpa de ser humano, pessoa, mero mortal. Tem culpa de não engarrafar, não poluir, não matar, não estar carregando uma tonelada consigo. Você é ciclista? Então VOCÊ É CULPADO, MARGINAL! É isso!

Ciclista, sua CULPA É EXISTIR!